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Flora Greenwood
Líder dos Curandeiros

Publicado por Flora Greenwood Qui Set 23 2021, 22:29


flora greenwood

                          
                           
                             Flora Greenwood                         
Flora Greenwood
                           
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Flora Greenwood
Líder dos Curandeiros

Publicado por Flora Greenwood Sex Set 24 2021, 01:55


mnemósine


Eu posso mudar.
Eu posso viver da minha imaginação ao invés da minha memória.
Eu posso me amarrar ao meu potencial ilimitado ao invés do meu passado limitado.
—  Stephen Covey

Uma Flora criança segurava uma espada obviamente grande demais para ela, e o peso vez ou outra a obrigava a apoiar a arma no chão de cimento. Os segundos pareciam se arrastar pela eternidade. Alguns sentimentos a invadiam: medo, insegurança, horror, raiva. Uma mulher se encontrava aos seus pés, amarrada, os olhos em completo desespero e súplica.

A criança queria fugir dali, mas não podia. Uma mão grande e pesada envolvia seu ombro esquerdo; talvez o dono do braço quisesse fornecer conforto, mas certamente falhava. Na verdade, fazia a pequena Greenwood se sentir em uma prisão. Ao olhar para trás, incerta, a menina era capaz de encontrar os olhos do desconhecido: pretos como a escuridão. Os cabelos, entretanto, eram do mesmo tom de vermelho que os seus.

— Mate-a, Helena. — O nome parecia errado. Flora arrepiou, mas não teve coragem de corrigi-lo. — Faça logo.

— x —

Pela quinta vez na semana, se é que sua contagem estava correta, Flora acordou de sobressalto. A respiração estava desregulada, subindo e descendo rapidamente, e o suor que se acumulara em sua testa agora ensopava os cabelos cor de fogo. Sentindo-se estranha, a Curandeira agarrou os lençóis ao seu redor com força, tentando se convencer de que estava segura.

Aquele sonho em específico estava insistindo em persegui-la. Dia após dia, seu sono era invadido por aquelas mesmas cenas, mesmas pessoas e mesmos sentimentos. Greenwood já havia decorado cada incômodo detalhe, embora não se sentisse exatamente satisfeita com aquilo.

De toda forma, a prole de Atena ainda não conseguia entender o motivo pelo qual estava tendo aquele sonho. Aquela criança certamente era ela, provavelmente no auge de seus onze anos, mas não havia realmente vivido aquelas coisas. Nenhum homem ruivo ou mulher amarrada jamais fizeram parte de sua infância. Tinha absoluta certeza.

Estava prestes a se deitar novamente, enrolando-se nos cobertores pesados, mas algo a impediu. A luz do lobby estava acesa, embora estivesse quase certa de que havia a apagado antes de se deitar. Talvez, se fosse uma garota normal, teria se convencido de que não era nada. Mas era uma semideusa, afinal.

Jogando os cobertores para o lado, levantou-se da cama. O ar frio da noite imediatamente colidiu contra a menina, que só vestia uma camisa que ia até a metade das coxas. Tremeu, mas não se deu ao trabalho de alcançar nenhuma roupa mais quente, uma vez que só queria resolver rapidamente a questão e voltar logo para cama.

Abriu a porta sem muita cerimônia, e os olhos exploraram a extensão do ambiente. Em um dos cantos, encostada contra a balaustrada de vidro, uma mulher se encontrava de costas para Flora. Sua pele era pálida, e os cabelos pretos eram longos o bastante para chegarem até a cintura. Apesar de ser uma desconhecida, a Curandeira não sentiu medo ou pavor, apenas irritação.

— Hmm… Olá? Talvez você não saiba, mas realmente não é legal invadir a casa das pessoas. Sabe, eu tava dormindo. Você meio que atrapalhou. — Parou a alguns metros de distância, as mãos na cintura.

A mulher, sem nenhuma reação de surpresa por causa da presença de Flora, virou-se calmamente. Tinha um pequeno sorriso no rosto, e analisou a semideusa dos pés à cabeça com um olhar quase afetivo, embora a garota não a conhecesse.

— Lembra-se de mim, Flora?

— E por que eu me lembraria? Nunca nos vimos antes. — A voz era forte, decidida.

A mulher sorriu, aparentemente se divertindo. Aquilo irritou Greenwood ainda mais. A situação era estranha, e a figura tratava tudo como se soubesse de algo que a prole de Atena desconhecia.

— Sou Mnemósine. Talvez reconheça o meu nome. — Ignorou a pergunta anterior da semideusa, se apresentando.

Flora reconhecia. Era a deusa da memória e mãe das Musas. Ainda assim, sentia-se desconfiada.

— E por que perguntou se eu me lembro de você? — Insistiu. Raramente desistia de obter as respostas que queria, e certamente não iria o fazer naquele caso.

— Acha coincidência que está tendo esses sonhos, Flora? — Deu uma pausa, o sorriso invadindo o seu rosto. A expressão era triste, contudo, como se sentisse pena da semideusa. — Lembranças.

A britânica nunca ficava sem palavras, mas naquele momento estava. Emoções demais a preenchiam: surpresa, pois realmente estava prestes a se convencer de que aqueles sonhos eram apenas cenas aleatórias; negação, porque realmente queria que fossem aleatórias; e, por fim, raiva, uma vez que se sentia farta dos deuses. De todo modo, controlou-se ao dar um longo suspiro e encarar a mulher com olhos atrevidos.

— Sinceramente, Mnemósine, eu preferia que você me deixasse em paz. Mas vocês deuses são bem inconvenientes, né, e já sei que não vai embora sem tentar transformar minha vida em um inferno. — Apesar das palavras ácidas, Greenwood deu um sorriso que claramente era irônico. — Então diga logo o que quer de mim.

Uma risada sem vida escapou da boca da deusa, arrepiando todos os pelos da Curandeira. Os olhos tristes encararam a menina com seriedade.

— Não quero nada de você, querida. Apenas vim te conceder a verdade. — Deu alguns passos, posicionando-se na frente da britânica. O dedo indicador, frio e longo, subiu até o queixo da garota, levantando-o. — Você está mais forte do que quando nos conhecemos, posso perceber. Já é capaz de lidar com o passado de forma apropriada.

Flora não podia negar que estava confusa. Geralmente era inteligente e astuta, mas certamente não conseguia imaginar o que Mnemósine queria dizer com tudo aquilo. Talvez mais tarde, quando estivesse sozinha, pudesse pensar melhor.

— Talvez pudesse ser mais clara com o que quer dizer. — Pela primeira vez em muito tempo, falou apenas o mínimo.

— É melhor que descubra sozinha, Flora. Talvez assim consiga acreditar e aceitar mais facilmente. — Com um estalo de dedos na mão esquerda, um pedaço de papel meio queimado surgiu na palma da deusa. Estendeu-o para Greenwood. — Irei lhe ajudar durante sua jornada.

Flora pegou o papel, incerta. Com uma caligrafia fina e delicada, um endereço estava escrito cuidadosamente. Um endereço de Londres, como não demorou a perceber.

— E como poderia me ajudar? — Levantou os olhos novamente, encarando a deusa.

— Ora, querida, você é mais inteligente do que isso. — Mnemósine piscou, já se afastando da semideusa. — Irei te ajudar com memórias, é óbvio.

— x —

A viagem até Londres foi tranquila, e Flora somente sentiu a ansiedade chegando quando já estava no bairro indicado no papel. Havia pensado bastante sobre o que tinha acontecido nas últimas horas, na verdade.

As palavras de Mnemósine eram claras: Greenwood estava sonhando com suas lembranças. Lembranças que já não possuía mais, entretanto. E, ao ser obrigada a aceitar isso, duas principais dúvidas surgiram em sua mente: quem havia apagado sua memória, e por qual motivo? Além disso, teria ela realmente assassinado uma pessoa? Tentava se convencer de que não, pois não sabia como reagiria caso a resposta fosse positiva. Ela salvava vidas, não as tirava.

Os passos decididos pararam em frente a uma casa bonita de dois andares, mas a garota não soube muito bem o que fazer. Sendo assim, limitou-se a tocar a campainha. Uma empregada já na meia-idade atendeu e, embora a semideusa achasse que seria tratada com grosseria e descaso, surpreendeu-se imediatamente. Com os olhos no cabelo cor de fogo da prole de Atena, a mulher ficou alguns segundos com a boca aberta.

— Não pode ser… — Resmungou, deixando Flora confusa. — Ele espera por você há anos, senhorita. Não achei que…

Flora talvez tivesse respondido, mas estava chocada demais para pensar em qualquer coisa para falar. Quem esperava por ela? E por quê? Entretanto, assim que recuperou a postura, encontrando novamente as palavras, não teve tempo de se pronunciar; a empregada deu espaço para ela entrar e a conduziu diretamente para uma sala de estar.

Sentia-se extremamente deslocada ali. Andou de um lado para o outro, inquieta, analisando cada detalhe da sala. Era uma construção peculiar, com pilastras de mármore branco e chão de pedra. Não possuía nada de pessoal ali, fossem fotos de família ou livros, e Greenwood ficou incomodada por não poder entrever a personalidade do dono da casa.

Esperou por pouco tempo. De repente, sentiu que alguém a observava. Virou-se de um ímpeto, os pés girando sobre o chão liso, e encontrou algo que a fez congelar onde estava. Eram os mesmos olhos negros do sonho recorrente, e os cabelos possuíam a mesma cor de fogo que os seus.

— Quem é você? — Disse a menina, a voz saindo mais grosseira do que pretendia. Juntou as mãos na frente do corpo, apertando os dedos uns contra os outros. — A empregada disse que estava me esperando. Como me conhece?

O homem pareceu verdadeiramente confuso. Deu alguns passos incertos na direção de Flora, mas, quando essa ameaçou se afastar, ele se interrompeu.

— Não me reconhece, Helena? — O mesmo nome dos sonhos. Daquela vez, contudo, Flora não teve medo de corrigir.

— Meu nome é Flora. Não sei quem pensa que sou, mas cometeu um engano. — Analisou o homem dos pés à cabeça. Era alto e musculoso. Impaciente, fez a mesma pergunta pela segunda vez. — Quem é você, afinal?

— Ah, não, meu amor… — A frase continha certo carinho, e Greenwood sentiu incômodo ao percebê-lo. — Flora é o nome ridículo que seus pais mortais te deram. O nome que eu te dei não é esse. É Helena. Tocha em grego.

A boca da Curandeira se abriu e fechou diversas vezes. Queria fazer uma pergunta, mas tinha medo de que a resposta fosse a mesma que já imaginava em sua própria mente. Teve que reunir imensa coragem para encarar o desconhecido nos olhos.

— E por que você me daria um nome? Você não… — As palavras morreram pela metade, e a menina desviou os olhos.

— Não se faça de burra, Helena. — A voz era ríspida. — Você é inteligente, já sabe a resposta. Eu sou seu pai.

Flora soltou um suspiro, contrariada. Já esperava por aquela resposta, obviamente; notara os cabelos idênticos aos seus, o carinho na voz, a forma como a corrigia. Mas isso não significava que estava pronta para ouvi-la.

O fato era que não estava realmente interessada em conhecer seu verdadeiro pai; era feliz com os Greenwood, e se sentia satisfeita em considerá-los como sua família. Na verdade, se tudo aquilo fosse uma situação comum, certamente apresentaria um enorme descaso com o homem à sua frente. Mas algo havia acontecido em seu passado e, se envolvia o pai biológico e memórias apagadas, provavelmente não devia ser nada de bom. Era aquilo que a prole de Atena temia.

Em seu subconsciente, um nome pareceu emergir de suas memórias: Sebastian Lencastre. Mnemósine estava mesmo a acompanhando, afinal. Talvez sua expressão de desgosto e surpresa tivesse ficado clara, pois as palavras seguintes do homem foram compreensivas.

— Sua memória foi apagada. — A voz do homem revelava emoções contrastantes. Surpresa, entendimento e talvez um pouco de raiva. — É por isso que, em todos esses anos, você não me procurou.

Estava prestes a dizer que nunca teria a intenção de procurá-lo de bom grado, em toda a sua vida. Queria informações, contudo, e não imaginava que seria útil irritá-lo. Desejava, mais do que tudo, entender o seu passado. Sendo assim, apoiou-se na cadeira ao seu lado e encarou o homem com firmeza.

— Conte-me tudo.

Sebastian se sentou, aparentemente cansado.

— Te tiraram de mim, meu amor… A empregada antiga achava que eu não seria um bom pai para você. Veja bem, era ela uma boa servente, mas costumava se meter demais em certas coisas. Não sabia que eu era um semideus, filho de Héracles, e pensava que eu te criaria de forma violenta demais, para te tornar uma arma. — Algo no tom com o que o homem disse aquilo deu a Flora a horrível impressão de que a empregada estava certa, afinal. — Aquela… mulher pegou você e fugiu numa noite em que eu não estava. Mas era pobre demais, medíocre demais para cuidar de uma criança tão incrível, e resolveu te entregar para os antigos empregadores dela, esses Greenwood que você insiste em chamar de pais. Eles sempre foram ricos, entende, e bastante reservados com suas vidas pessoais, então seria difícil descobrir que você estava com eles.

A voz começava a se elevar, revelando alguns resquícios de ódio e ressentimento. Para se acalmar, Sebastian serviu água em um copo de cristal e bebeu calmamente. Flora observou tudo com olhos inexpressivos. Quando o homem voltar a falar, parecia mais controlado.

— Passei onze anos inteiros te procurando, meu amor. Também busquei por aquela empregada, é óbvio, pois devia me vingar. Quando finalmente encontrei as duas, senti como se tivesse sido abençoado pelos deuses.

A mente de Flora, contudo, já não estava mais ali.

Uma pequena garota se debatia contra um homem grande, ambos com cabelos ruivos. Tentava se libertar do aperto contra ela, mas a força do desconhecido era grande demais para que tivesse qualquer êxito. Quando um pano molhado cobriu seu rosto, não demorou mais do que cinco segundos para desmaiar.

Acordou novamente em um local estranho. Um galpão amplo, com chão de cimento e paredes grossas. Os olhos estavam turvos, mas conseguiu reconhecer o mesmo homem que tinha a sequestrado. Além dele, uma mulher desconhecida estava ajoelhada e amarrada à sua frente. Parecia desesperada. Era, obviamente, a empregada que havia traído a confiança de Sebastian.

— Olá, Helena. Sabe quem eu sou? — Flora, confusa por ter sido chamada de Helena, apenas balançou a cabeça energeticamente. — Seu pai. Seu verdadeiro pai, Sebastian. Acredito que nunca tenha ouvido falar sobre mim.

Não, ela não tinha. E, na verdade, não se importava. Sabia já há muito tempo que os Greenwood eram seus pais adotivos, visto que era uma semideusa, e não tinha nenhum interesse em conhecer o homem com quem compartilhava sangue. Estava vivendo perfeitamente longe dele. Sendo assim, não deu muita importância para a informação. Respondeu com certo tom de deboche, mas se arrependeu no momento em que o homem a agarrou com agressividade. Sem cortejos, entregou-lhe uma grande espada com cabo dourado.

— Não me entenda mal, Hel, mas te criaram como uma criança tola… Você poderia ser tão habilidosa! E, agora que tenho você para mim novamente, pretendo te tornar uma verdadeira semideusa. — Sorriu, demonstrando carinho. Passou pela cabeça da prole de Atena que a forma de amar do homem era meio afetada. — Mate-a. E antes que pense em se opor, saiba que coloquei uma bomba na casa dos Greenwood… A detonarei caso se negue a fazer o que mando.

Flora já não parecia mais querer debochar da situação. Na verdade, sentia pavor. O que faria?


— Você me ameaçou — disse Flora, os olhos agora acusadores. Encarava o homem com desprezo. — Como pôde achar que eu te procuraria depois disso?

— Se não tivessem apagado sua memória, você entenderia! Se daria conta de uma vez por todas que os seus pais mortais te privam de seu verdadeiro potencial! Você poderia ser grande, Helena… — O modo como falava chegava a beirar o fanatismo, e a expressão de nojo da semideusa apenas se intensificou.

Meio atordoada, sentou-se na cadeira que estava ao seu lado. As mãos tremiam como nunca tinham feito antes. Tinha medo de descobrir o que havia feito, afinal. Matar alguém era algo totalmente fora de sua realidade.

— E então? — Sebastian não pareceu entender a pergunta, então Flora reformulou. — O que fiz depois?

— Você a matou, claro.

A prole de Atena havia resistido o máximo que podia. Argumentara e desconversara, mas o homem que se dizia seu pai não parecia querer negociar nenhum dos termos impostos. Após muitos minutos, Flora havia matado a mulher; a garganta ardia ao lutar contra as lágrimas. O corte tinha sido impreciso e incerto, uma vez que nunca manuseara uma arma daquelas anteriormente.

Quase deixou-se cair no chão, em prantos, mas algo ainda a incomodava. Se fosse embora, como iria garantir que o homem não a sequestraria novamente? De repente, um pensamento passou pela sua cabeça. E, sem hesitar, Flora segurou a espada desajeitadamente contra o próprio pescoço.

Sebastian pareceu surpreso e, sobretudo, transtornado. Apesar de ser um psicopata doentio, aparentava amar a filha do seu próprio jeito.

— Precisa me prometer que nunca mais irá me procurar. — Disse, a voz falhando brevemente. Recusava-se a chorar, e segurar as lágrimas demandava bastante esforço de sua parte. — E também que não irá detonar a bomba na minha casa, mas sim me contar onde ela está. Se não prometer, irei me matar agora mesmo.

Sebastian havia prometido ambas as coisas, afinal. Parecia ter uma confiança cega de que Flora iria ter uma súbita mudança de perspectiva e voltaria a procurá-lo. A pequena garota, entretanto, tinha certeza de que nunca mais queria ver o homem novamente.

Saiu do galpão transtornada e, quando voltou para casa, foi direto para o local onde supostamente estaria a bomba. Surpreendeu-se, entretanto, ao não encontrá-la. Não havia nada ali.

Nem em qualquer outro lugar.

Havia matado a mortal por causa de uma falsa ameaça, e nunca se perdoaria por aquilo.


Sentiu ódio. Não era uma garota que nutria sentimentos ruins pelos outros, mas naquele momento abandonou qualquer virtude que construíra durante os anos. Os olhos se encheram de lágrimas, mas não eram de tristeza, e sim raiva.

Sem perceber, a mão esquerda foi direto para a adaga na cintura, refletindo os pensamentos sangrentos que passaram pela sua mente por um segundo; aquilo fez um sorriso debochado surgir no rosto de Sebastian. Flora, em contrapartida, se sentiu perdida. Não era uma assassina, mas certamente sentira um instinto — e até vontade — de matar o homem à sua frente. Aquilo a abalava.

Não queria se tornar algo que abominava. Algo que Sebastian queria que ela se tornasse.

— Vai matar o seu próprio pai, meu amor? — Um tom de divertimento entrecortava as palavras do homem. — Eu disse que, aos poucos, você descobriria quem realmente era.

Greenwood se sentiu sufocada. Levantando-se da cadeira, encarou o homem com um olhar de repulsa e começou a andar em direção à porta. Quando estava perto da figura, parou tempo o suficiente só para murmurar algumas palavras.

— Você me enoja.

E saiu, sem se despedir.

— x —

Não tinha certeza se, depois de tudo aquilo, teria coragem de encarar a família mortal sem desmontar em lágrimas. Não queria e não iria ser fraca, embora fosse obrigada a admitir que as revelações tinham abalado seu subconsciente.

Tampouco achava que conseguiria enfrentar uma viagem até os Estados Unidos. Sendo assim, hospedou-se em um hotel qualquer de Londres. Não demorou para que a pessoa por quem esperava aparecesse: Mnemósine.

— Sabia que viria. — Disse Flora, a voz desprovida de emoções. Quando sentia demais, tendia a esconder qualquer vulnerabilidade e se fingir indiferente. No momento em que falou novamente, contudo, não foi capaz de esconder a dor. — Por que apagou a minha memória? E por que resolveu trazer ela de volta, afinal?

O sorriso de Mnemósine era triste. Parecia nutrir um carinho em especial por Flora, embora a semideusa não conseguisse pensar em nenhum motivo para tal.

— Joseph me pediu para fazê-lo. — A resposta foi capaz de surpreender Greenwood.

Joseph era seu vizinho londrino, o responsável por tê-la apresentado ao mundo semidivino e a treinado. Era seu anjo da guarda, seu tutor e sua inspiração para ter ingressado nos Curandeiros de Asclépio. Flora não pôde negar que se sentiu confusa ao ouvir o nome dele sendo inserido na conversa.

— Você estava destruída, Flora. Tinha apenas onze anos e não conseguia aceitar que havia matado uma pessoa. — Mnemósine falava com calma, como se a semideusa pudesse explodir a qualquer momento. — Joseph não achou que você poderia ter sobrevivido daquela forma. Ele fez preces a mim, e eu o ouvi.

Flora não sabia o que sentir. Estava indignada, pois não era dever de ninguém decidir de que forma ela sobreviveria; mas também se sentia grata, uma vez que aquelas memórias gradativamente teriam destruído qualquer bondade dentro dela.

— Mas você está forte agora, querida, e pode lidar com isso. Deveria saber a verdade sobre seu próprio passado.

Entre todas as coisas que achava ser naquele momento, certamente forte não era uma delas. Sequer tinha forças para falar isso, contudo. Com olhos cansados, encarou a deusa à sua frente com um pedido mudo para ficar sozinha.

— Sua índole não se define pelo seu passado, Flora. E com certeza nem pelo que foi obrigada a fazer sob pressão.

Mnemósine era uma boa pessoa, Greenwood podia perceber. Mas parecia ter dificuldades em perceber pedidos mudos. Quando a Curandeira falou, ficou óbvio que tinha reunido cada pingo de energia restante em seu corpo para realizar aquela tarefa.

— Agradeço a boa vontade. Mas, por favor, deixe-me sozinha.

A deusa abriu a boca para falar algo, mas desistiu. Com uma expressão triste, deixou a semideusa em meio ao seu próprio tormento. Entretanto, já solitária, não teve certeza de que era aquilo mesmo que queria, pois a vontade de chorar a inundou por completo.

Havia construído sua vida em cima de uma farsa. E não sabia o que faria para superar aquilo.

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Publicado por Ex-Staff 010 Sex Set 24 2021, 09:48

Flora GreenwoodFlora, você é adorável! Como é fácil ler o que você posta. Ainda que a personagem tenha suas dificuldades, você torna tudo tão confortável, como se sua narração fosse uma xícara de chá num dia de chuva. Estou ansiosa para ler o que virá a seguir, mas, por enquanto, estou mais do que satisfeita com o que li aqui.

Parabéns!
pontuação— Coerência: 40 de 40%
— Coesão: 30 de 30%
— Ortografia: 15 de 15%
— Organização: 15 de 15%

Total: 100% * 7 = 700xp + 350 dracmas



MONTY
                          
                           
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Flora Greenwood
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Publicado por Flora Greenwood Ter Set 28 2021, 16:50


peon


o inferno está vazio e todos os demônios estão aqui;
— william shakespeare.

Talvez estivesse se afogando em si mesma. Nunca havia sentido tanto, e mergulhar repentinamente em sentimentos conturbados não era tão agradável quanto parecia. Acima de tudo, sentia que era uma farsa.

Recentemente havia descoberto que algumas memórias de sua infância tinham sido apagadas, e recuperá-las não fora uma experiência nada satisfatória. Greenwood, apesar de se considerar uma pessoa boa e altruísta, havia matado alguém no auge de seus onze anos. Era fato que só havia realizado tal ato porque as vidas de seus pais tinham sido ameaçadas, mas aquilo tampouco tornava a situação mais suportável.

Esforçara-se bastante para demonstrar força; até mesmo fora trabalhar como se nada houvesse acontecido. Apesar disso, teve a impressão incômoda de que estava agindo sempre no automático, realizando seus deveres de forma distraída e desleixada como nunca fizera antes. E aquilo lhe incomodou. Dessa forma, acabou por desistir da falsa resiliência que tentava demonstrar e passara os últimos três dias em casa, rolando em sua cama ou lendo algo qualquer.

Se não tivesse recebido uma visita inoportuna, era certo que ficaria ali por mais muitos outros longos dias. Considerava-se uma garota forte, mas pouco queria exercer aquele papel ultimamente.

Havia acabado de sair do banheiro, jogando-se outra vez em cima de sua cama.

— Imaginei que iria se cansar de ficar enfurnada nesse quarto, mas parece que eu me enganei. — A voz grossa e gentil se fez presente. Flora não se assustou, mas ficou levemente surpresa.

Não precisou olhar para descobrir quem era. Já sabia. Asclépio estava sentado em um dos sofás do lobby em frente à suíte da semideusa. Com as portas duplas de vidro do quarto abertas, a prole de Atena conseguia ver e ouvir o deus perfeitamente.

— Sim, se enganou. — Disse, grosseira. Sem se importar com a educação, cobriu-se com o cobertor pesado. Justamente por causa disso, a voz saiu abafada quando voltou a falar. — O que quer, Asclépio? Não estou no clima para conversas, se não percebeu. Se tiver vindo só para me repreender, já pode levantar do meu sofá e ir dando meia-volta.

Não conseguia ver, mas sabia que o deus estava sorrindo. Tinham uma relação curiosa, Flora e Asclépio: apesar de ser o patrono dela, o homem permitia — embora ela não tivesse realmente pedido permissão — e gostava que ela a tratasse como um amigo qualquer. Eram próximos o bastante para que compartilhassem felicidades e angústias.

Dessa forma, aproveitando-se da intimidade que tinham desenvolvido, Asclépio levantou-se do sofá e caminhou até a cama de Greenwood, onde se sentou. Dando-se por vencida, a menina saiu de debaixo do edredom e encarou o deus.

— Sei que é forte, Flora. Todos que te conhecem sabem. A única que parece relutante em enxergar isso é você mesma. — Pegando a mão da seguidora, o homem a apertou levemente para transpassar conforto. — Não fique se remoendo pelo seu passado. Têm coisas mais importantes acontecendo no presente.

Inevitavelmente, Flora se sentiu tocada pelo gesto. Nenhuma palavra de conforto era tão reconfortante quanto as de Asclépio, no final, uma vez que admirava tanto o deus. Não conseguia dizer nada, mas ainda queria demonstrar gratidão, então deu um sorriso fraco na direção do patrono.

Logo em seguida, entretanto, escondeu a vulnerabilidade e encarou o deus com firmeza.

— Então você quer mesmo algo! — Disse Flora, triunfante. — Você não me engana, queridinho. Se está falando de coisas importantes acontecendo no presente, é porque quer que eu resolva algum de seus problemas.

Asclépio sorriu, o carinho por Flora transparecendo em sua expressão.

— Você é inteligente demais para o seu próprio bem, Flora. — A garota deu um sorriso em resposta. Logo depois, o homem assumiu mais seriedade. — Recebi um relatório de um dos meus Curandeiros.

— Se algum Curandeiro se deu ao trabalho de te mandar um relatório, realmente não deve ser nada de bom.

Uma risada seca escapou do homem.

— Receio dizer que você está novamente certa. — Levantou-se da cama, encostando-se na parede mais próxima. — Há algum tempo surgiu um novo vírus em Londres, e infelizmente está se espalhando rapidamente pela cidade. Não tenho tantas informações quanto gostaria, mas preciso da sua ajuda. Somos responsáveis pela saúde, e a situação está se mostrando bastante grave.

— Vírus? — Perguntou, franzindo a testa. — Obviamente quero ajudar, Asclépio, mas ainda confia em mim o suficiente para isso? Você sabe… com tudo o que descobri.

— Não seja boba, querida. — Sorriu calorosamente. — Confio em você mais do que em qualquer um.

[ … ]


Eram dez da manhã. Flora havia tomado banho, amarrado os longos cabelos em um rabo de cavalo e colocado uma roupa confortável o suficiente para caso precisasse lutar. Apesar de seu recente episódio depressivo, tratou de esquecer tudo momentaneamente para cumprir a missão que Asclépio lhe dera. Após isso, talvez, poderia voltar a se odiar.

Enquanto realizava todo aquele processo, refletiu: como poderia obter mais informações acerca do vírus? Demorou um bom tempo — talvez porque já estava há anos sem ver a pessoa em questão —, mas se lembrou de alguém. Joseph Morris, filho de Hipnos e Curandeiro de Asclépio. O homem, vizinho da família Greenwood, em Londres, havia sido quem ensinara tudo sobre o mundo semidivino para a menina e, posteriormente, se tornou sua inspiração para ingressar nos Curandeiros; infelizmente, tinham perdido contato após Flora ter se mudado para Nova Iorque, aos 14 anos, mesmo que ela ainda tivesse lhe contado algumas novidades de sua vida atual.

O homem trabalhava em um hospital de Londres, era inteligente e, sobretudo, curioso. Com certeza teria alguma informação útil, nem que fosse pouca. E, mesmo que estivessem há quatro anos sem se falar, ele provavelmente ainda considerava a semideusa o suficiente para lhe conceder dados. Ou era o que ela esperava.

Além disso, recentemente ficara ciente de que, quando ela era uma criança, Joseph havia clamado para Mnemósine apagar sua lembrança sobre o assassinato que cometara. Aquela era uma oportunidade dupla: podia salvar vidas inocentes e, depois — e somente depois, porque ainda sabia reconhecer prioridades — perguntar ao antigo amigo sobre aquilo.

Decidida, a garota soube instantaneamente o que fazer. Precisava viajar até Londres. O assunto era importante demais para que tratassem via Mensagem de Íris e, embora Flora não quisesse admitir que tinha um interesse oculto, estava absurdamente preocupada com os pais e com a irmã. Precisava pedir para que ficassem em casa!

Sendo assim, sem mala alguma — pois tinha roupas na casa dos pais — e com algumas armas, saiu de casa e chamou um táxi direto para o aeroporto. Já era meio dia quando embarcou e, como a viagem durava aproximadamente oito horas, Flora aproveitou para descansar o que não havia descansado durante toda a noite. Dormiu profundamente, e daquela vez nenhum pesadelo ou pensamento desagradável perturbou o seu sono.

Quando acordou, o avião já estava pousando em Londres. A semideusa despertou sobressaltada, surpresa por ter dormido tanto, e rapidamente olhou o relógio de pulso. Com o fuso de Nova Iorque, o horário ainda marcava 21 horas — o que significava que o voo havia atrasado um pouco —, mas em Londres já eram 2 da manhã.

Flora bufou, frustrada por ter perdido tanto tempo viajando, mas se conformou em esperar até o amanhecer para iniciar sua investigação. Desse modo, ao desembarcar, chamou um táxi e rumou para a casa da família Greenwood, onde utilizou sua chave para abrir a porta da frente e subir até o seu quarto silenciosamente. Entretanto, já havia dormido durante praticamente nove horas anteriormente, e então não sentia mais sono nenhum. Por causa disso, no decorrer do resto da madrugada, utilizou seu tempo para pensar no que de fato fazer.

Consultar Joseph era uma boa ideia, e ele com certeza lhe daria um panorama geral da situação. Mas também precisava de mais. Não podia ficar só na mesmice, ou então seu cargo de líder dos Curandeiros era inútil. Sendo assim, traçou um plano mental: iria até a casa do vizinho, depois ao hospital visitar alguns infectados e, finalmente, começaria a buscar algo para impedir a propagação da doença. Parecia fácil quando eram somente pensamentos, mas Flora sabia que passaria por dificuldades.

Sua ansiedade estava à flor da pele, de modo que não parava quieta nem por um segundo. Com a cabeça trabalhando freneticamente, a semideusa andava de um lado para o outro no quarto, falando sozinha e gesticulando amplamente. Vez ou outra olhava para o seu autorretrato na parede — que Angie, a irmã, havia feito quando tinham dez anos — e começava a conversar com ele, aliviada por ter alguém para lhe escutar.

— Sabe, Florinha, não é fácil ter uma missão tão importante. Estou sofrendo com uma questão, aliás, e você talvez possa me ajudar, já que continuou morando em Londres durante todos esses anos. — Deu uma pausa dramática, recuperando o fôlego. — Acha que Joseph ainda gosta de mim e irá me ajudar? Quer dizer, eu sei que éramos amigos, e ele até me incentivou a ir para Nova Iorque, mas nós nunca mais conversamos direito. Será que ele ficou chateado com algo? Espero que não...

E assim seguiu, conversando sobre coisas que a atormentavam. Quase já não suportava mais ficar dentro do quarto, sendo inútil, enquanto o mundo precisava da sua ajuda. Se não estivesse com a mente tão cheia, com certeza consideraria a possibilidade de que o chão iria se desgastar de tanto que ela caminhava sobre ele.

Sendo assim, quando o relógio finalmente chegou às sete da manhã, Flora literalmente deu um pulo de alegria. Sua família provavelmente já estava descendo para o café, e ela esperava que Joseph já estivesse acordado também. Pegando suas armas, abriu a porta do quarto e desceu as escadas quase correndo. A primeira pessoa quem viu foi Angie, que voltava dos jardins.

— Flora!? Pensei que você estivesse em Nova Iorque. O que faz aqui?

Flora não queria perder tempo, mas realmente precisava falar com a irmã.

— Angie, escuta! Por favor. Estou em uma missão importante, e precisei vir pra Londres de última hora. Seguinte: não saia de casa! E peça para que papai e mamãe também não saiam, por favor. Na verdade, obrigue-os a ficar em casa. É caso de vida ou morte! Diga a eles que eu estou na cidade e virei ver vocês em breve. — A irmã hesitou, então Flora a agarrou pelos ombros e a sacudiu com urgência. — Prometa, Angelina!

A irmã mais nova balbuciou uma promessa assustada, então a Curandeira imediatamente saiu correndo para fora da residência. Abriu a porta com estrondo, e em questão de segundos já estava em frente à casa vizinha, batendo a aldrava com a maior força que tinha. Se Joseph não estivesse acordado antes, certamente estava depois daquele escândalo.

O fato era que o homem abriu a porta com cautela, espiando quem estava ali antes de permitir a entrada. Entretanto, quando seu olhar se encontrou com o da garota, ele arregalou as pálpebras e escancarou a abertura, como se estivesse extasiado.

— Flora! Há quanto tempo não nos vemos? Anos! Que saudade! — disse e, subitamente, abraçou a garota.

Mesmo com todas as preocupações, Flora sorriu. Era bom saber que, apesar do tempo, ainda continuavam amigos. De todo modo, não tinha tempo a perder. Sequer se sentiu tentada a perguntar sobre suas lembranças apagadas, uma vez que vidas inocentes estavam em jogo; para a semideusa, aquela era sempre a prioridade. Na verdade, mal tinha pisado dentro da casa de Joseph quando abriu a boca, falando desesperadamente sobre sua missão.

— Ok, preciso de ajuda. Você deve saber do vírus que surgiu, né, já que trabalha no hospital e tal. Enfim. Asclépio me pediu para investigar isso, mas eu não tenho nenhuma informação. E, sei lá, você tem mais contato com o mundo real do que eu, que só fico isolada na minha própria enfermaria. E é o cara mais inteligente que já conheci! Por favor, por favorzinho, se tiver qualquer ideia do que esteja acontecendo, me diz.

Joseph esboçou uma cara de surpresa, como se não esperasse que Flora estivesse em uma missão por causa daquilo. Ainda assim, devia ter percebido a urgência na voz de Greenwood, pois fez um sinal de confirmação. Ele se sentou na cadeira da sala de estar, mas a menina preferiu se manter em pé.

— Não sei muito bem por que Asclépio lhe pediu isso… Mas tudo bem. Tudo por você, Florinha. Escute bem, então. De acordo com as pesquisas, descobrimos que o vírus se originou aqui em Londres, mais ou menos há duas semanas, e ele é altamente contagioso. Já era de se esperar, então, que ele se espalharia por toda a cidade, e durante os últimos dias os sintomas têm se apresentado de forma muito rápida. — Ele deu uma pausa para respirar, mas rapidamente retomou. — Os infectados sentem dor de cabeça, dor no corpo, febre, enjoos… Algumas vezes, em casos específicos, os órgãos vitais podem sofrer danos irreversíveis, levando a pessoa à morte. Estamos tentando conter a propagação, mas tem sido difícil. Não sabemos muito bem o que fazer.

Por algum tempo, Flora ficou calada. Imaginou que, se existisse um deus único, ele provavelmente estaria tentando puni-los. Mas… ei, deuses existem. E eles são bem mesquinhos às vezes. Como em um quebra-cabeça, as peças na cabeça da menina foram se encaixando. Tudo fazia sentido: Asclépio havia lhe pedido para investigar não só porque era uma Curandeira, mas também porque existia alguma intervenção divina naquele acontecimento. Greenwood só não conseguia imaginar qual deus havia feito aquilo…

Além disso, outra coisa fez perfeito sentido: se nenhum médico e nem mesmo Curandeiro havia encontrado alguma solução para o vírus, era porque estavam tratando o problema como algo meramente do mundo mortal. E aquilo não estava certo. Para solucionar o problema, era necessário fazer uma investigação que considerasse fatores semidivinos. E era aquilo que Flora faria.

— Ei, você sabe onde está o primeiro infectado daqui de Londres?

Joseph assentiu, causando certa excitação em Flora. Quando ele se pronunciou, a garota só faltou sair correndo em direção à rua, pois agora tinha um próximo destino: o mesmo local em que Morris trabalhava — já que havia atendimento tanto para mortais quando para semideuses —, embora ele não tivesse turnos naquele dia. O Hospital de St. Mary, em Paddington, Londres.

[ … ]

Flora pagou o táxi e saltou do carro quase de forma desesperada, já que estava ansiosa demais para continuar sua investigação. Quando chegou em frente ao hospital, contudo, ficou chocada com o que viu. As coisas estavam diferentes, no mínimo. Profissionais com roupas de proteção se posicionavam diante das portas, interrogando qualquer um que chegasse para ser atendido. A depender das respostas, o paciente recebia um tratamento diferenciado, que incluía máscaras de rosto.

Até uma hora atrás, Greenwood não sabia muito bem o que faria para chegar até o infectado. Afinal, como o vírus era contagioso, muito provavelmente não deixavam a pessoa receber visitas. Entretanto, antes de sair da casa de Joseph, o homem havia lhe dado um conselho: ela deveria, na recepção, chamar por Bernard Montecchio, um dos médicos do local; coincidentemente, era também o namorado do vizinho de Flora e, embora fosse mortal, certamente ouviria a garota caso ela citasse o nome do filho de Hipnos.

Sendo assim, assumiu a postura mais confiante que possuía e se aproximou das portas duplas do hospital. Uma mulher a abordou com urgência, perguntando o que ela estava sentindo, mas Flora rapidamente disse que estava ali só para visitar alguém, o que tranquilizou a desconhecida.

Ao adentrar o recinto, a britânica ficou levemente surpresa com o silêncio e a calmaria. Esperava mais caos, obviamente. Mas, após pensar por uns instantes, deduziu a coisa óbvia: não queriam deixar tão visível o problema que estavam vivenciando. O caos estaria concentrado lá dentro, onde nenhum cidadão veria. De todo modo, se aproximou da recepção com a expressão totalmente amigável, e uma mulher nova a atendeu.

— Bom dia. Em que posso ajudar?

— Bom dia, moça. Estou procurando pelo doutor Bernard Montecchio… ele está? — A mulher fez uma cara feia, como se Flora estivesse sendo inoportuna, então a menina teve que partir para a estratégia. — Sinto muito se estiver incomodando. É que um amigo meu, Joseph Morris, me enviou para dar um recado. E ele disse que era urgente… Ah, ele vai ficar bastante decepcionado por eu não ter conseguido...

No mesmo momento, a expressão da atendente mudou. Obviamente conhecia Joseph, então imaginou que Flora estava sendo sincera. Não demorou muito para que pegasse o telefone e ligasse para algum lugar, e pouco depois Greenwood estava sendo encaminhada para o consultório do médico. Ao chegar lá, abriu um sorriso amigável, mas traiçoeiro.

— Não tenho muito tempo. Preciso falar com o paciente… — E, naquele momento, olhou o nome que havia sido anotado por Joseph na palma da sua mão. — Eric Johnson. O próprio Joseph me pediu para fazer isso, eu juro que é importante. Olha só, a letra dele está na minha palma, com o nome do paciente e tudo.

Bernard hesitou, mas, por fim, olhou a mão de Flora. Depois, durante o que pareceu ser uma eternidade, considerou a possibilidade de ajudá-la. Greenwood estava prestes a retirar o bisturi do cinto e ameaçá-lo — embora não tivesse coragem de realmente cumprir qualquer ameaça —, quando o homem finalmente se levantou e concordou com a cabeça. Afinal, a confiança e comprometimento que tinha com Joseph era maior do que qualquer outra coisa, e a britânica admirava aquilo.

— O fato é que Joseph já me contou sobre a amiga ruiva dele que se mudou para Nova Iorque, então sei quem você é… — disse, causando certa emoção em Flora. Joseph havia falado dela? — Além disso, Joseph costuma me pedir coisas estranhas. Talvez essa seja uma delas. Mas precisamos ser rápidos.

Flora não precisou ouvir duas vezes. Juntamente com Bernard, quase corria pelos corredores do hospital, até que chegaram em uma ala meio estranha. Aparentemente os contagiados estavam isolados cada um em uma sala diferente, sozinhos, e somente era possível falar com eles através de um interfone. Ainda servia, de todo modo. Então, quando o médico apontou para Eric, Greenwood se adiantou ansiosamente e agarrou o aparelho.

— Eric, certo? Olá, eu sou a Flora. Meio que estou tentando te ajudar a sair dessa, então, se você puder falar, eu vou ficar muito grata. Além disso, queria ressaltar que eu não sou uma médica comum, então preciso que você fale cada detalhe do que está sentindo ou sentiu desde que isso começou. Até os que forem extremamente bizarros! Veja bem, eu sou bastante estranha também, então estou acostumada. Não vou rir de nada nem contar para ninguém, prometo.

O menino, que parecia ter mais ou menos quinze anos, ficou inicialmente assustado. Mas, após considerar as palavras, tomou coragem e agarrou o interfone que estava do lado de dentro da sala. Talvez Flora fosse obviamente maluca, e aquilo incentivasse Eric a falar; ou talvez estivesse simplesmente desesperado para finalmente desabafar com alguém que não perguntasse apenas sobre sintomas comuns do vírus. O fato era que, quando falou, sua voz era abafada e assustada.

— Bem… Já falei para os outros médicos, Flora. Estou sentindo muita dor de cabeça e nos músculos, e eu cheguei a desmaiar de enjoo algumas vezes. Dei febre também, e talvez meu pulmão esteja sendo afetado. — O garoto deu uma pausa, e subitamente olhou para os lados de Flora. Quando conferiu que só havia a menina escutando, se aproximou mais do interfone e começou a sussurrar. — Mas eu vi algo estranho… Não conte para ninguém. Da primeira vez que desmaiei, alguns flashes de imagens ficaram em minha cabeça. Primeiro vi um cálice comum envolvido por uma cobra; logo depois, a serpente sumiu e o cálice ficou podre… Não sei muito bem o que significa, mas essas imagens ficaram rodando na minha cabeça até que eu acordasse de novo. Não consigo esquecê-las!

Flora congelou. Obviamente, a primeira imagem descrita retratava o Cálice de Higéia, o símbolo de Asclépio. Mas por que ele havia ficado podre? Para propagar uma doença tão rapidamente, aquilo precisava ser obra de um deus que tivesse relação com a medicina, provavelmente. Dando voltas pelo recinto, Flora falava sozinha e gesticulava, raciocinando. Qual divindade seria capaz daquilo?

E, de repente, tudo fez sentido. O Cálice havia apodrecido. Tinha apenas uma figura no mundo que era quase tão bom na medicina quanto Asclépio e, coincidentemente, o indivíduo em questão deveria nutrir bastante ódio pelo deus e pela humanidade em geral, uma vez que não havia conseguido o posto de Curandeiro oficial do Olimpo.

— Claro, Flora! Isso é genial. Peon tem inveja de Asclépio por causa do seu talento e fama, obviamente, e tem ódio do Olimpo por apoiá-lo. Ele deve estar tentando atacar os mortais para causar impacto e se vingar! — Batendo palminhas de excitação, a semideusa correu novamente para o lado do interfone. — Eric Johnson, você é um gênio! Vou tentar te tirar dessa, fique tranquilo.

E, sem mais delongas, saiu correndo hospital afora, mas não sem antes parar para agradecer a Bernard.

[ … ]

Peon, o antigo curandeiro dos deuses gregos. Era certamente poderoso, Flora sabia bem, mas ainda assim não daria conta de causar tamanho estrago no mundo. Não sozinho. Passou pela mente turbulenta de Greenwood que, se Asclépio era capaz de ter seguidores, o outro também era. E, com semideuses te seguindo e fazendo o seu trabalho sujo, era bem fácil causar o caos completo.

De todo modo, ainda deviam ter um meio de propagar a doença rapidamente. Um truque! Para tentar deter a doença, a britânica deveria pensar como a vilã da situação. O que faria, caso quisesse disseminar um vírus de forma rápida e eficaz?

Caminhou pelas ruas de Londres com aquilo na cabeça, e a distração que o raciocínio lógico a causava lhe fez andar praticamente sem rumo. Contudo, quando percebeu o que fazia, estagnou e esfregou os olhos com força. Não adiantava nada gastar suas energias perambulando por aí.

Foco, Flora. Se você quisesse contaminar pessoas, o que faria? De repente, seus olhos se encontraram com uma cena curiosa: uma mulher adulta enchia sua garrafa de água em um dos bebedouros públicos que estavam espalhados pelas ruas de Londres. Subitamente, algo se remexeu dentro do cérebro da semideusa.

Era aquilo! A água potável direcionada aos bebedouros era a melhor forma de disseminação do vírus. Caso Peon fosse inteligente, e a menina acreditava fortemente que era, não perderia uma oportunidade daquelas. Sendo assim, a Curandeira soube imediatamente o que deveria fazer: se achasse o local em que a água era armazenada, provavelmente também acharia o seguidor do deus traidor e, consequentemente, a fonte da contaminação em Londres.

Com todos aqueles pensamentos em mente, Greenwood fez sinal para um táxi que passava lentamente. Quando ele parou, ela entrou com empolgação. O motorista era um homem de meia idade que apresentava um sorriso convidativo.

— Bom dia, moço! O senhor saberia me dizer onde é armazenada a água desses bebedouros públicos?

O homem sequer pensou para responder.

— Mas é claro… Foi uma divulgação danada quando isso foi construído! Utilizaram um terreno abandonado a uns 20 minutos daqui.

Animada, Flora disse que era exatamente para aquele lugar que queria ir. O homem pareceu achar estranho, mas não comentou nada. Virou-se para frente e dirigiu pelos 20 minutos subsequentes sem falar nada, uma vez que a ruiva parecia perdida em seus próprios pensamentos.

Quando chegaram, a Curandeira deu um pulo de surpresa e fez uma cara estranha. Estava tão dedicada em considerar as possibilidades do que aconteceria que mal se deu conta do trajeto ou do tempo dele. De todo modo, pagou o motorista, agradeceu e saiu do carro sem muita demora.

Contudo, antes de fazer qualquer coisa, analisou o local ao seu redor. Obviamente estava na parte de trás do prédio, e uma escada caracol levava até a uma porta a dez metros de distância do chão, que era a única forma de entrar por aquele lado. Imaginou que, quem quer que trabalhasse ali, provavelmente utilizava a entrada principal, já que deveria mostrar o crachá na recepção, então qualquer vestígio que estivesse vendo seria do seguidor de Peon. Também notou pegadas de número 40 pela areia ao redor da construção, e deduziu imediatamente que aquele pé pertencia a uma pessoa que pesava no máximo 60 quilogramas.

Então, tendo feito uma análise básica, Flora resolveu agir. Seguiu as pegadas, que levavam diretamente até a escada, e adentrou o prédio sem muito esforço, visto que a porta estava destrancada. Já dentro da construção, seus olhos demoraram aproximadamente uns cinco segundos para se acostumarem com a falta da luz solar e, quando o fizeram, observaram uma estrutura um tanto quanto peculiar: tudo ao redor era feito de metal, desde as paredes até o chão, e três tanques de água enormes estavam presentes. A semideusa inicialmente não notou nenhuma outra pessoa no ambiente, e por isso começou a explorar o local da maneira mais silenciosa que conseguia.

Não havia dado nem dez passos quando, instintivamente, sentiu que alguém a observava. Virou-se para trás com brutalidade, já levando a mão até o martelo preso às costas, quando algo entrou em seu campo de visão. Greenwood conseguiu se abaixar de última hora, e o que ela descobriu ser uma adaga passou praticamente raspando em sua cabeça. Ao levantar os olhos, viu um garoto magro e alto a encarando. Seu rosto perpassava raiva, e as pontas dos dedos estavam praticamente brancas de tanto apertar a clava em sua mão.

— Quem é você e o que está fazendo aqui? — Sua voz era quase um rosnado, e Flora se sentiu compelida a provocá-lo. Sendo assim, abriu um sorriso.

— Asclépio me mandou. Você deve ser o seguidor de Peon, o curandeiro fracassado... — disse e sorriu inocentemente, logo observando o outro adquirir ainda mais raiva. — Sabe, vocês estão realmente incomodando bastante, eu tive que sair do conforto da minha casa e vir até aqui só pra ver se você deixa de ser burro.

Abriu a boca para continuar falando, mas o inimigo não esperou. Levantou a clava que segurava e correu na direção de Flora, que imediatamente percebeu que o outro era mais forte que ela. Ainda assim, não se sentiu abalada. Desviou do primeiro golpe ao se jogar para o lado e, enquanto se levantava, alcançou o martelo e o segurou firmemente. Estava disposta a lutar, mas passou pela sua mente que preferia resolver aquilo de outro jeito. Por causa disso, deu alguns passos para trás.

— O que está ganhando com isso? As pessoas estão morrendo lá fora! — Quase gritou a última frase, o sotaque britânico se acentuando, e o olhar do adversário vacilou sob o seu. — Peon te prometeu algo? Pois, se sim, duvido que irá cumprir a promessa. Deuses não funcionam assim. Eles fazem o que querem e passam por cima de qualquer um.

O garoto não teve uma reação exacerbada. Era contido e, desse modo, Flora deduziu que não era um psicopata. Não estava ali porque queria ver a morte de inocentes — na verdade, talvez até se sentisse culpado por elas, dado o seu olhar vacilante —, mas provavelmente porque desejava mudança. Afinal, o Olimpo não era mesmo tão agradável assim. Suspirando, a menina concluiu que aquilo era um alívio. Se não queria o caos, talvez pudesse ser convencido a mudar de lado.

— Você não sabe o que está falando, garotinha. Tudo isso é bem maior do que você! — Seus olhos se esbugalharam, e Greenwood teve a impressão de que ele estava quase desesperado. — Peon ainda derrotará Asclépio e será médico dos deuses novamente. Será uma nova era, e Asclépio não terá vez.

Flora perdeu o ar só de imaginar tal cena. Teve vontade de gritar que aquilo iria custar a vida de pessoas inocentes, mas percebeu quase tardiamente que pouco adiantava se exaltar; precisava ser contida e descobrir o ponto fraco do garoto. Convencê-lo a mudar de lado seria trabalhoso. Contudo, se quisesse saber como frear a propagação, precisava tirar da boca do seguidor de Peon, e se esforçaria para fazer aquilo acontecer.

O fato era que não sabia torturar ninguém, e nem mesmo queria fazer aquilo, então teria que usar a lábia. Todos aqueles pensamentos passaram rapidamente pela cabeça de Flora e, quando o adversário se aproximou novamente, com a clava levantada, a semideusa segurou o martelo com força e bateu na arma do garoto, jogando-a longe. Mesmo assim, ele foi capaz de se recuperar do choque e acertar um chute no estômago da britânica, jogando-a no chão.

— Você não tem família? Ninguém com quem se importa? — Praticamente gritou, ainda no chão, fazendo o inimigo se assustar e a encarar.

Não soube muito bem se havia imaginado aquilo, mas lhe pareceu que algo tinha mudado no rosto do garoto. Flora levou aquilo como um incentivo, e novamente se pôs a falar.

— Peon não se importa com eles. Para que ele ascenda, sua família irá morrer. Seja com essa doença ou com a guerra, não importa. Você irá perdê-los! É isso que quer?

O garoto pareceu hesitar, mas apenas por alguns segundos. Logo depois, balançou a cabeça para despertar do que quer que estivesse imaginando e voltou a encarar Flora com olhos predatórios. Enquanto se aproximava da menina, tirou uma adaga do cinto e a girou entre os dedos.

Greenwood imediatamente se levantou do chão, levando o martelo de guerra consigo. Desviou de duas tentativas de golpe do adversário, mas foi atingida na terceira. A faca colidiu com o seu braço, que adquiriu um corte não tão profundo e imediatamente começou a sangrar. Irritada, a semideusa segurou sua arma com as duas mãos e a levantou, atingindo a parte perfurante na perna do seu inimigo.

O garoto à sua frente soltou um grito agudo de dor e se distanciou um pouco, o que deu tempo para a Curandeira voltar a falar.

Por favor, pense no que está fazendo. Eu sei que você deve ter seus motivos, mas isso não justifica a morte de quase toda a humanidade. Peon não se importa com os semideuses, e menos ainda com os mortais! Se vocês são meros soldados, os mortais são formigas prestes a serem esmagadas.

A voz da filha de Atena oscilava, uma vez que realmente acreditava no discurso que estava fazendo. A emoção e o medo eram claramente visíveis em seus olhos e, talvez por causa disso, o menino a encarou. Sua perna esquerda sangrava, mas sua atenção estava completamente voltada para a britânica.

— Eu só quero salvar todo mundo... — disse, praticamente sussurrando, e seus olhos marejaram com a ideia de fracassar.

Entretanto, o barulho de algo se chocando contra o chão despertou a semideusa de suas lamentações. O adversário havia deixado sua adaga cair no chão e, desarmado, se aproximava dela com passos urgentes. Curiosa e destemida, deixou que ele chegasse perto e, quando o fez, agarrou os ombros de Greenwood com força.

— Precisa prometer que vai salvá-la! Não vai deixar nada acontecer com ela. Prometa!

Confusa, Flora piscou algumas vezes antes de reunir forças para perguntar de quem o seguidor de Peon estava falando.

— Antoniella, minha… namorada. Ela é mortal, e tem alguns problemas. Está internada num hospício aqui em Londres. Estou fazendo tudo por ela, entende! Quero um mundo melhor pra ela, pra nós. Mas, se você estiver certa, estou colocando ela em perigo! Por favor, prometa que vai protegê-la!

A Curandeira não entendeu muito bem. Queria perguntar por qual motivo ele próprio não a protegia, mas sua voz desesperada e seus pedidos incessantes para que a britânica prometesse não lhe davam espaço para falar. Sendo assim, sem muita alternativa, prometeu. Recebeu informações sobre o nome completo da mortal e o local onde estava internada, e os olhos do outro marejaram.

— Diga que é minha amiga, embora não seja exatamente verdade, e ela vai confiar em você. Meu nome é Fred — disse, e ficou uns dois segundos olhando para o chão. Depois, mudando completamente de humor, esfregou o rosto e encarou Greenwood. — Você é uma boa pessoa, e por isso acho que tem razão. Vou te dar o que você quer em troca da proteção de Antoniella.

A filha de Atena concordou, ávida pela resposta que procurava. O garoto começou a andar até perto de um dos tanques de água e, ao segui-lo, sentiu seu coração bater um pouquinho mais rápido.

— Peon estabeleceu uma válvula de segurança. Afinal, ele não queria que seus próprios seguidores morressem. Então, quando o vírus entra em contato com o sangue de qualquer um de nós, mesmo que em pouca quantidade, ele é neutralizado. Perde o efeito. É como um soro.

Flora quase perdeu o ar, de tão alegre que ficou com a notícia. Assistiu ao garoto, então, cortar a mão e despejar um pouco do seu próprio sangue em cada um dos tanques de águas presentes, onde antes ele havia infectado. Saltitante, a menina se aproximou de um dos tanques e imaginou que tipo de reação invisível estava acontecendo ali.

— Isso é ótimo! Talvez você possa ir comigo até o hospital doar um pouco de sangue... — começou a dizer, virando-se para encarar o semideus. Mas sua boca se abriu em surpresa.

Fred, antes seu inimigo, havia recuperado uma de suas facas e enfiado em seu próprio peito. Desesperada, Greenwood correu até ele e começou a arregaçar as mangas, pronta para curá-lo.

— Por favor, não faça isso. Sei que contava com a minha ajuda, mas… Peon não iria me deixar em paz após essa traição. Iria me perseguir! Se quero que Antoniella sobreviva, eu preciso morrer.

A garota começou a argumentar, já clamando por Asclépio, mas foi tarde demais. Fred já havia deixado de respirar, falecendo em seus braços.

[ … ]

Há algumas semanas atrás, Flora nunca antes havia visto ninguém morrer. Agora não só tinha presenciado o suicídio de Fred, como também sabia que, quando criança, havia ela mesma matado alguém. No caminho de volta para a casa dos pais, ambas as lembranças martelavam em sua cabeça, enchendo-a de culpa.

No caso de Fred, tentava se convencer de que não podia ter feito nada. Afinal, aquela era a vontade do garoto. Mas era uma Curandeira, e consequentemente se sentia responsável pela vida dos outros. Já sobre o assassinato que cometera, ainda esperava poder falar com Joseph sobre o assunto.

Entretanto, deixou de pensar sobre aquilo apenas por um momento, quando o táxi estacionou. Pagou e saiu do carro e, ao invés de adentrar a casa dos pais, se dirigiu até a residência vizinha, onde Joseph morava. Ao bater na porta, inspirou algumas vezes para se manter calma.

O homem a atendeu rapidamente e, sem entrar ou esperar por perguntas, Greenwood tirou do bolso um frasco de tamanho mediano, que havia enchido o máximo possível com o sangue de Fred. Posteriormente, começou a despejar as informações de forma rápida.

— A doença não é comum. Peon está infectando as pessoas. — Os olhos de Joseph se encheram de perguntas, mas Flora não estava disposta a respondê-las. Sendo assim, apenas balançou a cabeça em negativa e levantou o frasco. — Isso é sangue de um seguidor de Peon. Ele neutraliza o vírus. Leve para o hospital imediatamente e tente trabalhar numa cura.

Aquilo foi o suficiente. Sem questionar, Joseph tomou o frasco em mãos e fechou a porta na cara de Flora, provavelmente indo se preparar para partir para o hospital. Cansada e reflexiva, a semideusa se afastou e começou a caminhar na direção da casa dos pais, onde decidiu que pretendia passar algumas semanas, já que ainda precisava conversar com Joseph sobre seu assunto pessoal e cumprir a promessa feita a Fred.

Naquele momento, a única coisa que queria era descansar. E era aquilo que faria.

[ … ]

Após três dias, Asclépio lhe comunicou que tudo já havia voltado ao normal em Londres. Um peso enorme saiu das costas de Greenwood e, descansada e satisfeita após todo o trabalho despendido no caso, resolveu que era finalmente hora de conversar com Joseph. Sendo assim, levantou-se de seu assento na biblioteca dos pais e partiu para a casa vizinha, tocando a campainha com ansiedade.

O filho de Hipnos, quando notou que era Flora, abriu um sorriso satisfeito.

— Flora, não sabia que ainda estava em Londres! — Convidou-a para entrar, logo indicando um sofá florido para que se sentasse. — Muito obrigada pela ajuda no caso… Estávamos ficando doidos. Asclépio disse que…

Joseph certamente iria continuar falando, mas Flora o interrompeu. Com apenas um olhar, o amigo soube que ela havia ido tratar de outros assuntos.

— Mnemósine me visitou outro dia. — Joseph arregalou os olhos e, somente por causa disso, Flora imaginou que ele já soubesse do que se tratava. Dispensando explicações, encarou-o com olhos alarmados. — Eu entendo por qual motivo pediu para que ela apagasse minha memória, Joseph… Eu era apenas uma criança. Mas por que nunca me disse a verdade depois que cresci? Passei todo esse tempo achando que eu era uma pessoa boa...

— Você partiu para Nova Iorque, Flora. Nunca mais nos vimos. Eu esperei por uma oportunidade perfeita para contar e ela simplesmente nunca apareceu. Quando você surgiu na minha porta alguns dias atrás, pensei que finalmente seria a hora, mas assuntos mais urgentes ocupavam nossas mentes. — Joseph balançou a cabeça, aparentemente chateado. Com ela, talvez? A britânica não saberia dizer, mas temia que sim. — E como pode sequer dizer que você achou que era uma boa pessoa? Você é, Flora. Uma pessoa menos boa do que você não deixaria de lado um assunto tão importante e se dedicaria a salvar vidas como você fez.

Então ele não estava chateado com ela? Ou decepcionado? Confusa, Flora abriu a boca para falar, mas tornou a fechá-la. Por que todo mundo insistia em falar que ela era boa, e ela ainda não acreditava? Mesmo depois da descoberta, Asclépio ainda gostava dela e lhe confiou uma missão de imensa importância; Joseph, bem à sua frente, encarava-a como se ela fosse a personificação da bondade.

— Não se torture tanto, querida. Você era uma criança e foi manipulada. Você agiu o melhor que pôde naquelas circunstâncias, tenha certeza disso.

E, pela primeira vez em algum tempo, Flora acreditou naquilo. Ela de fato era uma criança. E, se não julgaria outros por aquilo, por que estava se julgando? Sem conseguir se conter, jogou-se no colo de Joseph e o abraçou com a maior força que possuía.

Não importava quanto tempo se passasse, ele ainda seria uma das coisas mais importantes em sua vida.

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Publicado por Ex-Staff 010 Ter Set 28 2021, 17:29

Flora GreenwoodEu estou surpresa. É difícil construir personagens com características diferentes e se manter fiel aos atributos escolhidos para eles, mas você o faz com a Flora com uma naturalidade invejável.

Ela tem toda essa aura sutil, leve, que faz com que você anseie por mais, e beira ao irritante, o que torna tudo ainda mais divertido. Além disso, você tem um domínio da linguagem absurda, um fator importante para que a leitura flua com muita facilidade. Parabéns!
pontuação— Coerência: 40 de 40%
— Coesão: 30 de 30%
— Ortografia: 15 de 15%
— Organização: 15 de 15%

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Flora Greenwood
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Publicado por Flora Greenwood Qua Set 29 2021, 20:18


rescue


A relva do quintal ainda estava molhada por causa do sereno noturno, mas a cria de Atena pouco se importava com o fato. Com o corpo estirado sobre o chão, ela observava o céu matinal de Londres como se aquela fosse a coisa que mais lhe dava prazer em todo o mundo; o nascimento precipitado do sol quebrava o clima gélido que havia se instalado pela madrugada, mas o vento ainda era frio o suficiente para que usasse um casaco grosso. Os cabelos laranjas, espessos e em grande quantidade, espalhavam-se pela grama e contrastavam com o seu característico verde.

Estava perdida em pensamentos.

Se lhe perguntassem mais tarde, não saberia ao certo dizer no que estava pensando. Sua mente viajava por lugares fantasiosos e divertidos, onde poderia ficar o dia inteiro deitada observando o infinito azul que se estendia sobre ela. Vez ou outra, um sorriso prazeroso invadia suas feições, e as mãos pálidas agarravam a grama ao seu redor com certa gratidão.

Se não fosse por suas obrigações, certamente continuaria ali durante todo o dia. Mas a realidade não era aquela, e o dever lhe chamava.

— Flora? Está me ouvindo? — Angelina, a irmã, chamou pacientemente. Piscando para se livrar dos próprios pensamentos, Flora virou a cabeça para a menina e assentiu. Ainda assim, a outra soube imediatamente que ela estava mentindo. — Estou perguntando se minhas pernas estão posicionadas corretamente. Sinto que estou fazendo algo errado…

Por causa de sua posição, Flora não conseguia ver muito bem o que a irmã fazia. Por causa disso, sentou-se no gramado para observar melhor. As irmãs Greenwood tinham tirado os dois balanços do quintal, deixando apenas o arco que antes os sustentava, e então pendurado um saco de boxe bem no meio. Angelina tentava aprender a lutar e, embora não tivesse o dom para aquilo, estava se esforçando bastante.

— Afaste mais os pés um do outro — disse, e esperou que a irmã obedecesse. Logo depois, trocou o tom sério por um mais brincalhão. — Sim… E endireite a postura. Parece que você está com vontade de morrer, queridinha.

Abriu um sorriso sincero, mas Angelina apenas revirou os olhos e começou a treinar novamente. Finalmente se levantando, Flora esticou o corpo e limpou os resquícios de grama que tinham se prendido em suas roupas e cabelo.

— Escute, Angelina — chamou, e a irmã olhou para ela. Como a voz novamente demonstrava seriedade, algo raro em sua personalidade, a garota considerou que era um assunto sério. — Preciso fazer algo. Não sei como vai proceder, então talvez eu volte para Nova Iorque logo depois. Papai e mamãe estão viajando, portanto você é a única que precisa ficar sabendo disso.

Angelina a olhou, curiosa, mas sabia que não deveria perguntar. Nunca perguntava sobre o mundo semidivino. Sendo assim, somente concordou com a cabeça, e o humor de Flora imediatamente voltou a ser leve.

Entretanto, em sua mente, havia preocupação.

Em uma de suas últimas missões, tinha se encontrado com um dos seguidores de Peon, Fred. E, ao fazê-lo mudar de lado, Flora teve também que prometer algo: protegeria a sua namorada mortal, que estava em um hospital psiquiátrico, de qualquer situação ruim pela qual pudesse passar. Greenwood não entendera muito bem o que estava prometendo até que, subitamente, o garoto se matou na sua frente.

E agora carregava a responsabilidade de encontrar e proteger a tal Antoniella, mesmo que ela morasse em Londres, e Flora em Nova Iorque.

Certamente teria trabalho pela frente.

[ ... ]

Já possuía tanto o nome do hospital quanto o da paciente, então não havia sido difícil encontrá-la. De todo modo, quando saiu do táxi, não deixou de ficar surpresa com o que viu. A paisagem do subúrbio de Londres contrastava excessivamente com o bairro residencial nobre em que os Greenwood moravam e, desacostumada com a aura de abandono e destruição, Flora precisou de alguns segundos para novamente voltar a agir.

A rua estreita e fétida possuía somente prédios de ambos os lados, e esses estavam, em sua maioria, necessitados de pinturas e com algumas janelas quebradas. Os carros que passavam pela viela eram poucos, e nenhuma pessoa além da Curandeira se atrevia a ficar tanto tempo fora de alguma das construções. O local era perigoso, afinal.

Sendo assim, Flora se apressou em agir. Andou com cuidado para não pisar em alguma das várias poças que pontuavam a calçada, e rapidamente chegou em frente ao prédio referente ao hospital psiquiátrico. A escada de poucos degraus levava até uma porta de madeira e, acima desta, uma placa desgastada revelava as palavras Hospital Arco-íris. Considerando o nome, o local era um tanto quanto sem cor.

Batendo na madeira com leveza, Flora esperou por uns três minutos antes de qualquer pessoa se dar ao trabalho de atendê-la. Finalmente, uma mulher visivelmente de mau humor abriu a porta.

— Olá! Eu sou Flora Greenwood, é um prazer conhecê-la! — Esperou um cumprimento ou algo do tipo, mas recebeu apenas silêncio. De qualquer forma, manteve o tom animado. — Será que posso entrar? Esperava visitar uma amiga que está… hospedada aí.

— Não estamos em horário de visita. — A resposta foi seca e definitiva. A mulher estava prestes a fechar a porta quando Flora, insistente, esticou o braço para impedi-la.

— Não me leve a mal, moça, mas eu realmente preciso ver a minha amiga. Estamos há um tempo sem nos falar, e estou realmente preocupada. Não irei sair daqui enquanto você não me deixar entrar — disse, embora sua voz não contesse nenhum tom de ameaça. Pelo contrário, só estava expondo os fatos. Entretanto, quando a mulher não mostrou uma reação propícia, a prole de Atena decidiu mudar de estratégia. — Bom, eu não queria fazer isso, mas… Tenho certeza de que posso denunciar o lugar por falta de higiene, ou por ausência de cuidados necessários. Isso só se você não permitir a minha entrada, obviamente.

Os olhos da mulher se arregalaram, visivelmente com medo. Com um sorriso triunfante, Greenwood adentrou o ambiente deplorável assim que a figura à sua frente cedeu. O local em questão claramente possuía muitos problemas, e uma inspeção de qualidade não seria nada favorável a eles.

— Espere aqui — disse a mulher, curta e grossa, após a filha de Atena informar qual paciente gostaria de ver: Antoniella Bennett.

Flora olhou em volta. O saguão era amplo, e o chão de madeira tinha buracos em inúmeros lugares; já as paredes continham uma quantidade considerável de mofo. O balcão da recepção, que estava logo à frente da escada larga pela qual a mulher havia subido, possuía apenas um telefone fixo e uma agenda abatida. Encantador.

Ficou esperando por uns dez minutos; certamente os funcionários do local não estavam preocupados com agilidade e cordialidade. Imaginou o que a mulher estaria fazendo, afinal, para demorar tanto assim. Mas as possibilidades eram inúmeras, e a Curandeira tinha que admitir que estava predisposta a imaginar o pior, dada a situação do estabelecimento.

Quando estava prestes a subir as escadas por conta própria, ignorando a educação que tinha, a atendente apareceu novamente. Tinha uma expressão insatisfeita, e somente fez um sinal para que a menina a seguisse. Dando pulinhos de excitação, a filha de Atena correu para acompanhar a figura lânguida e apática.

— Posso perguntar quantos pacientes têm por aqui? — Disse Flora subitamente, analisando tudo ao redor. Obviamente, estava preocupada com a situação a que expunham os mentalmente debilitados. — Quer dizer, não é da minha conta, mas eu estou bastante curiosa. E você provavelmente vai me ignorar e eu vou ficar falando sozinha, mas não custa tentar. Enfim, vocês não parecem cuidar muito bem assim do local, se me permite falar.

Bom, a mulher até permitia que Flora falasse, mas — como o esperado — não se importava com nenhuma das palavras proferidas. Ainda assim, incentivada pelo silêncio, Greenwood continuou falando. Citou o teto com uma visível infiltração de água, a luz piscando e até mesmo as plantas mortas pelo corredor.

Quando finalmente pararam em frente a uma porta com desenhos de florzinha, a menina já havia praticamente recitado todos os problemas acerca do hospital. Totalmente ignorada, entretanto. Derrotada, suspirou e se contentou em adentrar o quarto que a esperava.

Abriu a porta e a fechou antes que a mulher pudesse entrar também, já que queria conversar a sós com Antoniella. No momento em que seus olhos pousaram na garota, contudo, foi capaz de esquecer qualquer coisa que havia anteriormente planejado falar.

Antoniella possuía olhos verdes grandes e assustados e, embora tentasse esconder, hematomas recentes estavam espalhados por várias partes de seu corpo. Por causa da presença desconhecida de Flora, havia se espremido contra a parede dos fundos, mantendo distância da semideusa. Um dos braços estava escondido atrás das costas, e a ruiva teve a impressão imediata de que a outra possuía uma arma.

— Quem é você? — A voz era abafada e preenchida de medo, como se já tivesse passado por experiências traumatizantes o suficiente. De relance, Greenwood percebeu que a menina não possuía sotaque britânico. Provavelmente não havia nascido no Reino Unido.

Sem se mover, Flora abriu um sorriso empolgante, embora não fosse aquilo que de fato sentisse. Sentia angústia, surpresa e medo do que poderia estar acontecendo com Antoniella.

— Olá, Antoniella. Meu nome é Flora. — Esperou alguma reação, mas a outra menina se manteve imóvel. — Acho que temos um amigo em comum. Fred, se lembra?

À menção do nome do rapaz, Antoniella imediatamente mudou de postura. Largou o objeto que segurava nas costas — uma faca, como foi possível ver — e correu até Greenwood, os olhos desesperados por ajuda. No mesmo momento, a semideusa percebeu que a mortal confiaria em qualquer um que fosse minimamente próximo de Fred.

— Onde ele está? Eu preciso dele! Ele já não me visita há semanas! Diga para ele vir o mais rápido que puder.

— Creio que isso não será possível, Antoniella. Fred foi… embora. Não vai voltar.

A menina, antes desesperada, pareceu perder qualquer brilho restante, mesmo que pouco, que houvesse dentro dela. Sentou-se na cama pequena e puída que havia no quarto, deixando que os braços caíssem de forma desesperançosa.

— Ele me… deixou? Como ele pôde?

— Ele fez isso para te proteger. Ele me fez prometer que iria te ajudar daqui para frente — disse, sendo sincera. Logo em seguida, aproximou-se da menina e também se sentou sobre o colchão fino. — Escute, Antoniella. Você parece machucada. O que aconteceu?

A menina olhou de relance, desconfiada, sem saber ao certo se podia confiar em Flora. Lentamente, para não assustar a garota, a semideusa estendeu o braço para encostar na outra. Um arrepio correu por Antoniella ao ser tocada, mas ela não reagiu negativamente.

— Você pode confiar em mim. Fred quis que fôssemos amigas, e vou me esforçar para isso. Vou te proteger de qualquer coisa daqui para frente.

Talvez porque estava desesperada, ou talvez porque o nome de Fred a deixava sensível, Antoniella resolveu falar. Virou-se abruptamente para a britânica, segurando os braços dela com certa agressividade e urgência.

— Preciso sair daqui. Outro diretor assumiu o hospital semana passada, e ele está fazendo coisas com a gente. — E mostrou os hematomas pelo corpo.

A respiração de Flora se desregularizou, assustada com o que tinha acabado de ouvir. Certamente imaginara que os hematomas não podiam significar coisa boa, mas ouvir da boca da menina era ainda mais chocante. Além disso, deduziu que aquele era justamente o motivo pelo qual não queriam deixar os pacientes receberem visitas.

Precisava tirar Antoniella dali.

— Certo. Você é de onde, Antoniella?

— Nova Jersey.

— Tem família por lá?

— Nenhuma que importe.

— Veio pra Londres por causa de Fred?

Antoniella assentiu. De repente, pareceu para Flora que aquela não seria uma situação tão difícil assim de ser contornada. Levantou-se subitamente da cama e começou a andar pelo quarto minúsculo, arquitetando um plano mentalmente. Enquanto falava sozinha, os braços gesticulavam freneticamente.

— Você pode ficar quieta? Está me deixando nervosa. — A voz de Antoniella se projetou depois de alguns minutos, irritadiça, trazendo a ruiva novamente para o mundo real.

Antes de falar, Greenwood conferiu se aquilo era mesmo o mais sensato a se fazer. Mas acabou por perceber que não tinha muitas opções.

— Acontece que eu moro em Nova Iorque, Antoniella, e tenho certeza de que Fred ficaria muito satisfeito se você fosse comigo. Seria mais fácil te ajudar assim.

— E por que eu confiaria em você?

Sorrindo, Flora tirou do bolso traseiro da calça um colar. Assim que Fred se matou, a Curandeira havia retirado a joia de seu pescoço, justamente com a intenção de dar para Antoniella. O pingente era uma rosa e, ao abri-la, uma foto do casal sorrindo era revelada. Com as mãos firmes, entregou o objeto para a mortal à sua frente.

— Ele pediu que eu lhe entregasse isso. — Mentiu, embora por uma boa causa. Lembrou-se do momento em que havia limpado o sangue da joia, e engoliu em seco.

Subitamente, a expressão da outra se modificou por completo. Lágrimas brotaram em seus olhos, e as mãos começaram a tremer de emoção.

— Eu vou com você.

[ ... ]

Tinham juntado todos os pertences de Antoniella, que eram poucos, em uma mala de mão pequena. Além disso, Flora usara um telefone que a mortal tinha roubado e escondido recentemente — embora ela somente tivesse ligado para Fred, a única pessoa em quem confiava, que obviamente nunca atendera — para chamar um táxi até ali.

Depois de dez minutos, estavam prontas para partir. Só faltava passar pela moça da recepção. Abriu a porta do quarto com cuidado, e viu que a mulher se encontrava no final do corredor, esperando. Fingindo um sorriso simpático, a Curandeira a convocou. Com um andar arrastado, ela respondeu ao chamado.

— Queria perguntar se… — Começou a falar, fingindo que realmente tinha alguma dúvida, quando a figura se aproximou o bastante ela.

Entretanto, no segundo seguinte, havia agarrado o kindjal e batido a sua empunhadura no crânio da mulher, projetando um baque alto e forte. A recepcionista desmaiou no mesmo momento, e Greenwood amparou seu corpo e o deitou no chão para que não fizesse demasiado barulho.

— Vamos, Antoniella. — Chamou.

Estava percorrendo o corredor quando viu que uma câmera escondida as observava. Imediatamente, travou a mandíbula e tentou controlar a respiração. Iriam tentar capturá-las. Com um sinal para que Antoniella ficasse atrás dela, segurou o kindjal com mais força. Não podia usar nenhuma arma mais ofensiva, ou acabaria matando os mortais.

Quando chegou à recepção, soltou o ar ao ver apenas dois homens grandes as esperando. Provavelmente tinham subestimado Flora. Com um sorriso, escondeu o kindjal atrás das costas.

— Ei. Que tal nos deixarem passar? Vejam bem, eu posso ser extremamente convincente quando…

Não conseguiu terminar de falar. Ambos correram até Greenwood, na esperança de pegá-la, embora não portassem nenhuma arma. Reagindo rapidamente, a semideusa deslizou pelo chão e passou por baixo da perna de um deles, dando-lhe um chute no saco enquanto isso. Quando se levantou, por trás do homem, novamente usou o cabo do kindjal para bater na cabeça do adversário, fazendo-o desmaiar.

O outro se aproximou mais, embora agora temeroso. Flora, que havia sido acidentalmente encurralada contra o balcão, pensou no que fazer. O homem estava tomando cuidado demais para que ela simplesmente atacasse.

E então uma ideia lhe ocorreu. Jogando o kindjal no chão, fez uma cara de inocente.

— Tudo bem. Você me pegou. Tente não ser tão agressivo…

Convincente. Sendo assim, o adversário se aproximou. E, sem que ele esperasse, a Curandeira agarrou o telefone fixo sobre o balcão e o acertou no crânio do homem o mais forte que conseguia, fazendo-o cair. Logo em seguida, abaixou-se para agarrar sua cabeça e chocá-la contra o chão, produzindo um barulho alto.

— Desculpe por isso — sussurrou. Não era exatamente fã da agressão, mas às vezes não tinha escolha.

Voltou o olhar para Antoniella, esperando que ela estivesse no mínimo assustada, mas sua expressão trazia dureza. Quase parecia feliz pelo que Flora fizera com aqueles homens. Passou pela mente de Greenwood, então, que não conhecia a mortal, ou tampouco sabia sobre seu passado ou doenças mentais. Aquilo podia ser perigoso. Mas, por hora, resolveu não considerar tudo o que tinha possibilidade de dar errado. Estava apenas cumprindo uma promessa.

Correu para fora do lugar, juntamente com a outra garota, e em questão de segundos já estavam dentro do táxi, que as esperava do lado da calçada.

Sem pensar muito, pediu para que o motorista se dirigisse até o aeroporto. Estava com uma desconhecida, e certamente não a levaria para dentro da casa dos pais. Teria que viajar até Nova Iorque imediatamente.

E, no caminho até o aeroporto, certamente ligaria para a polícia. Precisavam intervir naquele hospital o mais rápido que pudessem.

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Publicado por Ex-Staff 010 Qui Set 30 2021, 09:07

Flora GreenwoodAdorável! Mais uma leitura que fluiu como pluma. Conhecer a personalidade de Flora a cada postagem sua é muito intrigante e definitivamente agradável!

Parabéns!
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